Sam Fali e Sum Fléflé eram um casal que habitava num luchan distante, perdido no obó.
Sum FléFlé foi um dia à caça acompanhado pelo cãozinho fiel Loló. Muita carga apanharam nesse dia. A carga era muito pesada. Como transportá-la de uma só vez?
Tantos quilómetros a percorrer, subir ôquê, descer ôquê. Peneta, é a vida do homem.
Sum Fléflé sentou-se numa pedra a meditar. Nisto, Loló agita a cauda e diz em surdina:
– Sum Fléflé, eu ajudo você, se você guardar segredo. Cale a sua boca pi-pi-pi…e não diga nada a ninguém.
– Segredo, Loló? Porquê?
– Se Sam Fali sabe que eu carrego, meu trabalho de carregador nunca vai acabar.
– Bom, Loló, descansa que eu calo a minha boca.
– Não diga também que eu sei falar língua de gente – acrescentou, preocupado, Lóló.
– Está descansado, companheiro…
O que é certo é que a carga chegou a casa toda de uma vez, enquanto Sam Fali lavava no ribeiro mais perto a roupa da família.
Quando chegou a casa, interpelou o companheiro:
– FléFlé, como é que você conseguiu trazer tanta carga? Quem o ajudou?
– Eu sozinho.
Fali, incrédula, insistiu sempre.
Eu sozinho – era a resposta lacónica do amigo fiel.
Fali insistiu, voltou a insistir e ameaçou arrumar a carga e voltar obó era casa da sua mãe.
Sum Fléflé, atrapalhado, coçava a cabeça, pensava que a solidão no obó era difícil…Acabou por declarar:
– Nosso cão Loló ajudou o dono.
Loló ouviu, gemeu, gemeu, gemeu, deu duas voltas ao quintal e foi-se deitar nas cinzas da lareira.
Desde essa altura, nenhum cão, nem sequer os seus descendentes, voltaram a falar.
Glossário:
luchan > localidade (termo usado em São Tomé)
obó > floresta
ôquê > ladeira
peneta > destino felicidade
“Contos Tradicionais da CPLP”